quinta-feira, 9 de novembro de 2017

Faxina




Joguei fora meus calçados velhos, as roupas rasgadas demais para serem reaproveitadas e os sentimentos desgastados também. Passei um pano e livrei-me dos velhos maus hábitos, da sujeira e de tudo aquilo que me fazia mal e era tóxico.
Deixei de lado tudo o que me podava e permiti que minhas raízes e meus galhos crescessem novamente. Lustrei meu melhor sorriso e saí por aí. Abandonei as lágrimas e deixei somente a chuva escorrer em meu rosto. Dei-me uma chance de me abrir, me entregar, e até de me decepcionar novamente, por que não?
Queimei os papeis acumulados e adotei um novo papel em minha vida: o de me redescobrir e me reinventar sempre que possível e necessário. Fingi estar bem muitas vezes para não ter de encarar a realidade de que, na verdade, cumpria apenas o papel da existência, mas agora escreverei os novos capítulos.



Porque a vida é assim mesmo. A gente mantém aquilo que faz bem, mas também temos que nos livrar daquilo que não nos serve mais para dar lugar a coisas melhores. Não se encontra um emprego digno enquanto se está preso àquele chefe abusivo. Não se encontra aquela pizza maravilhosa enquanto continuar pedindo a mesma comida chinesa de sempre. Não se escreve uma história enquanto continuar batendo na mesma tecla.
O coração também é assim. Às vezes a gente passa tanto tempo reciclando os mesmos velhos sentimentos, tentando reaproveitá-los à exaustão, quando na verdade deveriam ir para o aterro. Temos aquela ideia de que não podemos desistir nunca, mas muitas vezes não é bem assim não. Acredite, desistir pode ser um ato de coragem e de amor-próprio. E se não fizermos uma limpeza de vez em quando, ficaremos iguais àqueles acumuladores dos reality shows, que fisgam-se ao passado e não conseguem desapegar. Não me levem a mal, mas acho que tanto o apego quanto o desapego têm seu lado bom, embora muito se pratique este segundo. O problema é quando o medo da novidade, do abandono e da felicidade nos travam, e aí vem a tal da estagnação.



Enfrentei meu medo de deixar as lembranças proporcionadas pelos objetos e objetivos velhos irem embora, quando na verdade elas já nem eram mais a prioridade da minha mente. Era eu quem insistia em mantê-las ali, presas. Eram eu quem continuava a caminhar reto quando deveria ter procurado atalhos. Era eu quem mantinha um círculo vicioso de apegos que já não me pertenciam mais. Mas a gente aprende. Um dia percebemos que é possível, sim, se desvencilhar e iniciar um novo ciclo. Pode até incomodar no início, mas nunca é tão ruim quanto imaginamos que seria. E desejo a você muitos e muitos novos ciclos, e que toda a pele morta de seus anseios seja esfoliada e renovada.

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